Título original: The Book Thief
Autor: Markus Zusak
Tradutor: Manuela Madureira
Colecção: Grandes Narrativas nº 385
Editor: Editorial Presença
Edição/reimpressão: Setembro de 2010
ISBN: 9789722339070
Páginas: 468
Sinopse: Molching, um pequeno
subúrbio de Munique, durante a Segunda Guerra Mundial. Na Rua Himmel as
pessoas vivem um dia-a-dia penoso, sob o peso da suástica e dos bombardeamentos cada vez mais
frequentes, mas não deixaram de sonhar. A Morte, narradora
omnipresente e omnisciente, cansada de recolher almas, observa com compaixão e fascínio a estranha natureza dos humanos. Através do seu olhar intemporal, é-nos
contada a história da pequena Liesel e dos seus pais adoptivos, Hans, o
pintor acordeonista de olhos de prata, e Rosa, a mulher com cara de cartão amarrotado, do
pequeno Rudy, cujo herói era o atleta negro Jesse Owen, e de Max, o pugilista judeu,
que um dia veio esconder-se na cave da família Hubermann e que escreveu e ilustrou livros, para oferecer à rapariga que roubava livros, sobre as páginas de Mein Kampf recuperadas com tinta branca, ou ainda a história da mulher que convidou Liesel a frequentar a sua biblioteca, enquanto os nazis queimavam livros proibidos em grandes fogueiras. Um livro sobre
uma época em que as palavras eram desmedidamente importantes no seu
poder de destruir ou de salvar. Um livro luminoso e leve como um poema,
que se lê com deslumbramento e emoção.
A minha opinião: Confesso que tinha algum receio de ler este livro. Todas as opiniões que lia e ouvia indicavam que, se por um lado, esta seria uma história de que iria gostar muito, por outro, o seu potencial esmagador era enorme... Não me enganei, adorei e chorei descontroladamente no final, mas estou muito contente por o ter lido.
A Rapariga Que Roubava Livros passa-se num subúrbio de Munique, durante a Segunda Guerra Mundial, e é narrado pela Morte. Sim, essa mesmo, a verdadeira, que trabalhou intensamente na época e que é, possivelmente, a personagem mais humana do livro. Isto porque, talvez devido ao distanciamento que tem, demonstra uma compaixão que faltou a tantos Homens naquela altura...
A perspectiva em que a história nos é contada é muito interessante e completamente nova para mim: é a perspectiva dos alemães comuns e prova que nem todos os alemães eram nazis ou se identificavam com a ideologia. Se muitos idolatravam o Führer e eram nazis convictos, muitos outros faziam o que era esperado deles para evitar represálias e alguns ainda, como o pai adoptivo de Liesel, recusaram até ao fim renunciar à sua humanidade e arriscaram a própria vida para ajudar os que não tinham qualquer esperança.
Para além da história e de todo o contexto histórico, a grande riqueza deste livro assenta nas suas personagens, ricas, complexas e extremamente bem caracterizadas. Começando pela rapariga que dá título ao livro, Liesel, que é levada pela mãe para Molching, onde irá ficar com uma família adoptiva, e cujo irmãozinho mais novo morre na viagem, episódio que a marca profundamente e que constitui o seu primeiro (mas, infelizmente, não o único) encontro com a Morte. É também o que despoleta a sua compulsão para roubar livros, uma vez que rouba o Manual do Coveiro durante o funeral do irmão, uma compulsão tornada ainda mais estranha pelo facto de Liesel não saber ler. Mas serão vários os livros que roubará ao longo da história...
Os seus pais adoptivos, Hans e Rosa Hubermann, personagens inesquecíveis, que ao início parecem tão diferentes, mas que afinal têm tanto em comum... Extremamente humanos e compassivos, apesar dos seus feitios completamente distintos, não só acolhem Liesel em sua casa e a tratam como uma filha, acolhem um judeu na cave durante meses, colocando em perigo a sua própria segurança apenas porque sabem que o que está a acontecer não está certo. Para mim, foi aqui que Rosa revelou as suas verdadeiras cores pois, apesar do mau feitio, de estar sempre a resmungar e a chamar nomes, aceitou sem hesitar acolher um judeu em sua casa apenas porque o seu marido havia feito uma promessa há muitos anos.
O judeu em questão é Max, que se torna quase como que um outro filho dos Hubermann e um amigo (praticamente um irmão) de Liesel. Apenas por ser judeu, Max é considerado sub-humano, mas com os Hubermann volta a sentir-se um homem, ainda que obrigado a viver escondido nas sombras, volta a ousar sentir esperança. E alimenta o vício de Liesel, escrevendo-lhe histórias nas páginas que arranca de uma cópia de Mein Kampf e pinta de branco.
E Rudy, o vizinho e melhor amigo de Liesel, que cresce com ela. O corajoso Rudy que idolatra um atleta negro numa sociedade que pretendia o triunfo da raça ariana, sempre pronto a defender os desprotegidos e tão precoce, que uma das coisas que mais almeja é um beijo de Liesel.
O equilíbrio precário de todas estas personagens, como é óbvio, não dura para sempre e algo tão banal como um simples gesto de compaixão e amor ao próximo, ou uma decisão tomada por amor paternal, acabam por despoletar situações dominó que culminarão de forma extremamente dolorosa no final.
Sinto que acabei por falar pouco dos livros que Liesel roubava, mas eles são muito importantes ao longo de toda a história, acabando por funcionar como uma tábua de salvação a que Liesel se agarra e que a ajudam a manter-se sã. E posso garantir que não há nada de fictício nisso...
Uma história fantástica e poderosíssima, sobre a importância de nos mantermos humanos mesmo nas piores condições e sobre o poder curativo dos livros, com personagens ricas e complexas que aprendemos a amar ou a odiar. Para aqueles que, como eu, ainda estão receosos em o ler, façam-no sem medos, mas leiam com um pacote de lenços à mão.
Classificação: 5
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